Sempre gostei
dos pobres (1). Nunca entendi e nunca
pensei sobre o porquê de tal simpatia. Não tinha necessidade de compreender. Só
gostava!
É verdade
que cresci sem o jugo do preconceito, pois compartilhei desde tenra idade dias
inteiros de ricas brincadeiras com os filhos dos caseiros e das empregadas que
trabalhavam com nossa família.
De uns anos para cá comecei a me interessar
pelos moradores de rua e por isso houve meses
em que poucos foram os dias nos
quais não tirei fotos de pessoas em tais condições. Todas as fotos que tirei
deles tem algum sentido para mim. Algumas os mostram felizes tomando sol ou
conversando. Outras os mostram
entretidos lendo ou fazendo algum trabalho manual. Outras ainda os retratam
dançando em calçadas movimentadas, contrastando com a bravura dos nossos
heróicos executivos, preocupadíssimos em cumprir suas épicas missões.
Obviamente
varias das fotos também os retratam em seus movimentos mais manjados, como as
que os flagram procurando comida no lixo, pedindo esmolas ou pescando bitucas
de cigarros.
Ontem,
depois de refletir sobre o porquê de minha simpatia pelos menos abastados, fui
tirar uma soneca. Quando estava a um passo de ser engolido por algum sonho, me
veio a seguinte informação: Em hebraico a palavra usada para pobre é Ani e Rearranjando suas letras, temos a palavra Ain: Olho!
Os Olhos são as janelas da alma.
Em português dizemos que os olhos são as janelas da alma. Em
hebraico, ao invés de janelas, os olhos são vistos como a fonte de onde a alma
se manifesta no mundo físico.
Essa idéia
se expressa no fato de os dois, olho e fonte, compartilharem do mesmo nome: Ain.
Certamente
olho e fonte também dividem o mesmo termo devido ao fato de o olho se
transformar numa fonte de águas ao jorrar emoções no ato de chorar.
... E o pobre, onde é que fica ?
Qual a
relação do pobre, Ani, com o olho, Ain e com a fonte, Ain ?
Com o passar
dos anos tenho percebido em conversas ou em simples trocas de cumprimentos, uma
grande resistência de vários de meus interlocutores “mais abastados” em travar contato visual.
Conversar ou
cumprimentar alguém que desvia o olhar me faz saltar os olhos! É uma coisa que
me incomoda bastante!
Por outro
lado, quando os interlocutores são crianças pequenas ou pessoas oriundas de
classes menos abastadas, parece que este déficit é menor.
Vejamos...Qual será a causa de
tamanha deficiência? Trago aqui alguns olhares : )
(O diagnóstico é do Dr Aroldo, meu
Psicoculista. Por isso amigos, perdoem a linguagem demasiadamente técnica:)
1 -Quanto
maior a fartura material que um individuo possui, maior a incidência do Déficit de visão multifocal emocional, causando
dificuldades em seu portador ao tentar focar os “vários pontos”, (varias
pessoas), que habitam seu campo visual. (seu mundo).
2-Quanto
maior a independência econômica, maior a incidência da ilusão óptica em seu portador
de ser um gigante auto-suficiente em relação aos que o cercam, causando
indiferença e até cegueira no que se
refere à existência destes.
3-Quanto
maior o materialismo, maior a miopia
e menor o astigmatismo emocional,
limitando o olhar de seu portador ao que está próximo e embaçando sua visão em
relação ao que está distante. (dependendo do grau desta miopia, os distantes podem ser seus próprios cônjuges, pais, filhos
ou irmãos).
(Até aqui o diagóstico de meu
Psicoculista Aroldo.)
Para o pobre, porem, a necessidade trás a rica percepção da unidade que jaz por
trás da diversidade, pois faz ele enxergar no outro uma extensão de si mesmo,
porquanto dele carece a sua existência.
Portanto, não
raras vezes vemos pessoas carentes agindo de modo solidário e até mesmo
repartindo o pouco que tem com pessoas todavia mais miseráveis.
A autenticidade do Olhar!
Nos salmos
nos referimos ao apelo e à comunicação que existe no olhar:
“Como os
olhos dos servos na direção do seu Senhor e como os olhos da serva na direção
de sua senhora. Assim são nossos olhos para o Senhor nosso Deus até que se
apiede de nós.”
Por que o
salmo se refere ao olhar como fonte de apelo e não à fala?
Por que a
fala pode ser forjada, falsificada. O olhar, porem é mais difícil de ser
disfarçado, pois é... A JANELA DA ALMA!
Depois
dessas considerações, me parece ter encontrado a fonte de tal simpatia pelos
menos abastados: Autenticidade, empatia, foco, troca....OLHAR!
P.S.
Neste exato
momento lhes escrevo do meu notebook que acabo de “resgatar” de um bar onde o
havia esquecido, a uma quadra de onde estou agora, no coração da favela de Heliópolis...
O pagamento
pelo resgate ? Uma frase: “Deixei uma mochila aqui...”
O lugar de
onde lhes escrevo ? Cine Favela...
focado por um monte de câmeras e retratado numa de tela.
No meio de
gente que sabe... olhar!
*(Uso essa
palavra somente por questão de efeito no texto, porque a verdadeira pobreza e a
verdadeira riqueza não tem nada a ver com o dinheiro!)
Este
texto é dedicado a minha esposa Jacque Ventura, que tem o mais autentico e
lindo olhar!
9 comentários:
Amei Mores, vc e um ser especial, obg. por fazer parte dos meus amigos virtuais do face.
Excelente moré!!!Vocé é uma pessoa de um grande coração e principalmente de grandes atitudes, parabéns!
Sureide e Daniele, muito obrigado! Eu agradeço os elogios e a leitura!
Espero que vocês sigam sempre acompanhando e contribuindo com seus comentarios !
Shalom!!!
Adorei tudo,a sua visita a conversa com esse nobre morador da favela e principalmente seus valores devidos e corretos ao que se refere a POBREZA & RIQUEZA...Precisamos de mais VENTURAS,dando EXEMPLO para todos jovens,velhos e crianças...Gratidão professor...Lena Antabi
Cara Amiga Lena. Agradeço muito o elogio, me deixa muito contente!
Sabe amiga, estes valores aprendi convivendo com varias pessoas especiais, de realidades sociais, países e religiões diferentes, mas com uma coisa em comum: A percepção de que a maior riqueza existente na face da terra reside no próprio ser humano!
Vamos em frente Lena! Muita benção, muita Luz!
Pôxa, que maravilha de texto, espero que muitos tenham lido e que muitos reflitam tbm. Parabéns Morê!
sei bem o que vc escreveu,nessa não preciso nem imaginar,ja sai muito pelas ruas na madrugada,e tambem onde trabalhava lidava com pessoas nas ruas,mais preocupada em tira-los dos bancos da praia,quase nunca parava para conversar preocupada ,em retira-los do local pois os turista,se incomodavam com sua presença,um dia sai as ruas na madrugada e tive pelas experiencias,encontrei pessoas alegres e aprendi muito com eles,voltei para casa chorando muito pois, nunca tinha sequer olhado nós olhos desta pesoas,pois estava preocupada só comigoe com meu serviço e ainda me achava desfortunada,pedi perdão Hashem pois vi o quanto era ingrata com o Criador e só olhava para mim mesma e meus problemas .hoje meu olhar e outro.linda esta historia more parabéns.há 18 minutos · CurtirCurtir (desfazer) · 1Carregando...
Muito obrigado amiga! Seu comentario, realmente complementa este o meu relato. Pois alem de sentirmos uma empatia maior, tambem passamos a enxergar nossa propria situação de uma perspectiva diferente.Um grande abraço e Shalom!
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Parabéns pelo seu texto e sua empatia por aqueles que sofrem. A conexão pelo olhar revela o desejo da alma em entrar no universo do outro, pois percebe o poder que cada um de nós tem e que a grande maioria desconhece.
Um abraço
Eduardo
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